William Blake e “O Casamento do Céu e do Inferno”: A Energia Transformadora de Rintrah
William Blake (1737-1827) é um dos nomes mais influentes da literatura inglesa, com uma obra que transcende gêneros e épocas. [LER ARTIGO ANTERIOR] Seu livro “O Casamento do Céu e do Inferno” (1790-1793) é uma síntese poderosa de poesia, prosa e ilustração, que expressa uma visão radical e romântica do cosmos.
Publicado durante o contexto tumultuado que sucedeu a Revolução Francesa, o texto desafia as convenções religiosas e morais da época, propondo a união dos contrários como base para o progresso espiritual.
Entre seus personagens, destaca-se Rintrah, um arquétipo que incorpora a energia ardente da ira justa e o espírito profético da rebeldia contra a opressão e a complacência.
Este artigo explora o papel de Rintrah e seu significado simbólico, analisando sua conexão com os temas centrais da obra de Blake e sua importância na crítica à moralidade convencional no que ela pode ter de hipócrita.
Rintrah e a Ira Justa: A Voz da Rebelião Profética
Logo na introdução de “O Casamento do Céu e do Inferno”, Blake apresenta Rintrah com a seguinte passagem:
“Rintrah ruge e sacode o fogo no ar carregado.”
Essa imagem inicial é uma declaração poderosa que anuncia o tom transgressor do texto. Rintrah representa a índole profética da ira justa, uma força essencial para romper com estruturas opressivas. Seu “rugido” simboliza a necessidade de confrontar as injustiças do mundo, rejeitando a passividade e a submissão.
A Transformação do “Homem Justo”
Blake descreve no poema como o “homem justo”, outrora manso e passivo, se transforma em uma figura de fúria no deserto. Essa transição é um elemento central na crítica de Blake à moralidade tradicional, que associa bondade à docilidade.
Para Blake, a verdadeira justiça exige coragem e rebeldia.
Essa ideia ressoa em sua própria ética criativa, que enfatiza a energia e a paixão como motores da transformação espiritual e social.
Simbolismo das Imagens Naturais
Rintrah é cercado por um rico simbolismo natural que enfatiza a tensão entre criação e destruição. A interação entre rosas e espinhos, abelhas e charnecas áridas, rios e ossos sugere um universo em constante fluxo, onde a energia de Rintrah atua como força regeneradora. Nesse cenário, a destruição não é vista como um fim, mas como um meio para o renascimento.
Crítica à Moralidade Convencional
Blake utiliza Rintrah para questionar os sistemas sociais e religiosos que promovem a docilidade e marginalizam a rebeldia.
Em “O Casamento do Céu e do Inferno”, ele descreve a “serpente rasteira” que caminha com “humildade mansa” como um símbolo de hipocrisia, onde o mal se disfarça de virtude.
Essa crítica é direcionada às instituições que usam a moralidade como instrumento de controle, negando a autenticidade da energia humana.
Blake rejeita a divisão maniqueísta entre bem e mal, propondo uma visão integrada do cosmos. Em suas palavras:
“Sem Contrários não há progresso. Atração e Repulsão, Razão e Energia, Amor e Ódio, são necessários à existência humana.”
Essa afirmação é a base para sua teoria dos contrários, segundo a qual o progresso espiritual depende do equilíbrio dinâmico entre opostos.
Contexto Geral de “O Casamento do Céu e do Inferno”
Blake compôs “O Casamento do Céu e do Inferno” em um período de intensa agitação política e social, influenciado pelo clima da época de iminência da Revolução Francesa e pelas transformações culturais do Romantismo. O título do livro é uma referência irônica à obra “Paraíso e Inferno”, de Emanuel Swedenborg. Enquanto Swedenborg propunha uma visão moral restritiva e dualista, Blake advoga por uma perspectiva unificada, na qual desejo físico e espiritualidade coexistem no cosmos divino.
O texto combina prosa e poesia, com destaques como o “Argumento” e os “Provérbios do Inferno”. Esses provérbios desafiam convenções e estimulam o pensamento, como neste exemplo:
“O caminho do excesso leva ao palácio da sabedoria.”
Blake também descreve sua visita ao Inferno, ecoando obras como “A Divina Comédia”, de Dante, e “Paraíso Perdido”, de Milton. Diferente das concepções tradicionais, o Inferno de Blake é retratado não como um lugar de punição, mas como uma fonte de energia criativa e libertação.

Influências e Repercussões
A obra de Blake influenciou gerações de escritores, artistas e pensadores. Aldous Huxley, por exemplo, inspirou-se em “O Casamento do Céu e do Inferno” para escrever “As Portas da Percepção”, que por sua vez deu nome à banda de rock The Doors. Outros autores, como C.S. Lewis, responderam à visão de Blake com obras como “O Grande Divórcio”.
A influência de Blake é particularmente evidente em movimentos contraculturais, como o da década de 1960, que abraçaram sua celebração da energia criativa e sua crítica à autoridade.
Conclusão
Rintrah é uma figura central em “O Casamento do Céu e do Inferno”, personificando a energia transformadora que desafia as normas e promove o progresso. Sua ira justa e seu papel profético ilustram a crença de Blake de que o confronto com a opressão e a hipocrisia é essencial para a renovação espiritual.
A obra de Blake continua a ressoar devido à sua abordagem visionária, que une poesia, arte e filosofia para explorar a natureza humana. Ao nos desafiar a abraçar os contrários e reavaliar nossas ideias de moralidade e progresso, “O Casamento do Céu e do Inferno” permanece uma obra fundamental para aqueles que buscam compreender as profundezas da alma humana e os paradoxos da existência.
O poema de Rintrah (no original)
from The Marriage of Heaven and Hell: The Argument
Nuvens vorazes pairam sobre as profundezas.
Uma vez submetido e na senda perigosa,
O homem justo manteve seu curso através
Do vale da morte.
Há rosas onde crescem espinhos,
E na charneca estéril
Cantam as abelhas.
Foi então plantada a senda perigosa,
Um rio e um manancial
Sobre cada penhasco e tumba,
E sobre os ossos branqueados
A argila rubra emergiu;
Até que o vil deixou o suave caminho,
Para trilhar sendas perigosas e impeliu
O justo até as estéreis paragens.
Agora, a furtiva serpente desliza
Na dócil humildade
E o justo enfurece nos desertos
Onde vagam os leões.
Rintrah ruge & vibra suas flamas no ar carregado;
Nuvens vorazes pairam sobre as profundezas.

“Talvez o poeta mais original da literatura inglesa, William Blake foi uma espécie de símbolo das manifestações socioculturais dos anos 1960 e 1970. Ao lado da psicologia de Carl Jung e Sigmund Freud, da filosofia e da religião orientais, das experiências da geração beat e do flower-power , via-se em sua poesia a expressão de uma nova era de Aquário (…)” SAIBA MAIS: https://amzn.to/4amsRY4
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