O sublime conto de Kafka “Uma mensagem imperial” está em domínio público. Segue, na íntegra:
“O Imperador, dizem os rumores, mandou uma mensagem para você, o humilde destinatário, a insignificante sombra que se encolhe na mais remota distância ;de seu leito de morte ele enviou uma mensagem só para você. Ele ordenou ao mensageiro que se ajoelhasse ao lado da cama e sussurrou-lhe a mensagem. Ele teve tanto cuidado que ordenou ao servo que a cochichasse de volta em seu ouvido. Então, com um movimento de cabeça, ele confirmou que estava certo: ´sim´, disse ele perante os espectadores reunidos para ver sua morte – todas as paredes haviam sido derrubadas e nas espaçosas escadarias abertas os grandes príncipes do Império estavam reunidos num círculo- diante de todos eles o Imperador enviou sua mensagem.
O mensageiro imediatamente parte em sua jornada, um poderoso e infatigável homem, ora empurrando com o braço direito, ora com o braço esquerdo, ele abre caminho por entre a turba. Se encontra resistência ele apenas aponta para o próprio peito, onde brilha o símbolo do sol. O caminho então se faz mais fácil para ele do que seria para qualquer outro homem.
Mas as multidões são vastas, elas jamais terminam.
Se ele pudessem chegar aos pátios abertos, como voaria rápido. Você certamente logo ouviria as bem-vindas pancadas de seus punhos em sua porta. Mas em vez disso, ele gasta sua força inutilmente. Ele ainda está apenas atravessando as câmaras de um dos palácios internos, ele jamais chegará ao fim delas. E mesmo que conseguisse chegar ao fim, isto de nada adiantaria, pois logo em seguida teria que abrir caminho escada abaixo. E se conseguisse abrir caminho, isto também de nada adiantaria, pois ele teria ainda que cruzar os pátios e depois dos pátios o segundo palácio externo e mais uma vez as escadas e os pátios e mais uma vez outro palácio e assim sucessivamente por mil anos. E se finalmente ele irrompesse pelo portão mais externo de todos- mas isso nunca, nunca poderia acontecer- a capital imperial se descortinaria à sua frente- o centro do mundo, entupido até arrebentar com o próprio refugo.
Ninguém conseguiria forçar passagem por ali, muito menos alguém que levasse a mensagem de um homem morto.
Mas você se senta à janela quando a noite cai e sonha com isso assim mesmo…”
Sobre Kafka
Franz Kafka (1883-1924), um dos escritores mais influentes do século XX, nasceu em Praga em uma família judaica de classe média. Sua vida foi marcada por uma relação complexa com o pai, que ele considerava uma figura poderosa inclusive fisicamente, o que contrastava com sua fragilidade. De fato, a tuberculose, diagnosticada em 1917, o acompanhou até o fim de seus dias. Sua carreira profissional não lhe incentivava ambição ou era motivo de orgulho. Em outras palavras, era apenas um fardo. Kafka era formado em Direito e trabalhava numa companhia de seguros.
O autor se tornou conhecido por suas obras que exploram temas como alienação, burocracia, culpa e o absurdo da existência. Além disso, suas narrativas, repletas de personagens atormentados e situações surrealistas, possivelmente refletiam suas próprias angústias e a atmosfera da sociedade em que vivia. Obras como “A Metamorfose”, “O Processo” e “O Castelo” tornaram-se clássicos da literatura mundial, influenciando gerações de escritores.
Apesar de ter escrito prolificamente, Kafka publicou pouco durante sua vida e destruiu grande parte de seus manuscritos. Foi seu amigo Max Brod quem organizou e publicou postumamente seus trabalhos, contrariando o desejo do autor. A obra de Kafka, marcada por um estilo conciso, explora emoções profundas e as complexidades das relações sociais.
Em conclusão, a influência de Kafka na literatura universal é inegável.
Termos como “kafkiano” passaram a fazer parte do vocabulário comum para descrever situações absurdas e/ou opressivas.
Sua obra continua a ser objeto de estudo e análise, revelando novos significados a cada ângulo e inspirando novas gerações de leitores.
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