“Risíveis amores”, de Milan Kundera.

“Risíveis amores”, de Milan Kundera. Pense bem. O título já pode gerar estranheza. E, de fato, este “risíveis” não está aí por acaso. O ser humano vivendo o sublime enlevo de uma paixão pode ser sempre observado pelo prisma do deboche por quem está de fora.

Afinal, as ações daquele que ama loucamente parecem exageradas, seu olhar se perde no infinito e seus suspiros de criatura apaixonada são profundos demais. É a idealização. Enquanto outros podem ver apenas a balconista bonitinha da farmácia, o “enfermo” apaixonado vê a própria Vênus feita de carne e osso a vender remédios e indicar pomadas.

É justamente dessa contraposição entre “real” e subjetivo que vem o cinismo muitas vezes cômico do autor.

O livro contém erotismo, mas de bom gosto, sem escancarar nada, podendo frequentar as melhores bibliotecas sem maiores constrangimentos.

Algumas informações sobre MILAN KUNDERA

Antes de começarmos a falar da obra propriamente dita, um pouquinho de contexto histórico. Milan Kundera (1929-2023), escritor tchecoslovaco, teve uma relação conturbada com o comunismo, sendo expulso do Partido Comunista duas vezes. Embora envolvido politicamente, não se via como um romancista político.

A partir de 1979, já vivendo na França há 4 anos, deixou de abordar política em seus escritos, focando em ideias filosóficas.

Os contos de “Risíveis Amores”

Sem spoiler, falar dos meus dois contos favoritos dessa coletânea de relatos cativantes.

Primeiro, quero falar do conto “O pomo de ouro do eterno desejo”. O narrador (cujo nome não é dado) tem uma imensa admiração pelo amigo Martin. Isso porque esse Martin tem a capacidade de realizar um jogo compulsivo de abordar com maestria todas as mulheres solteiras que cruzam seu caminho. O detalhe? Esse personagem é casado com uma mulher que ele, obviamente, respeita e admira, como fica claro ao longo do texto.
[SPOILERS – pule para NINGUÉM VAI RIR se quiser evitar]

Fica claro também que nesse jogo da dupla de amigos, o objetivo não é a “conjunção carnal”, mas a abordagem em si. É uma caça eterna.

Ou uma pescaria, daquelas em que os peixes são devolvidos às águas. Explicando melhor: quando chega a hora de finalmente sair com duas mulheres aleatórias, Martin é facilmente convencido por seu comparsa que já está tarde e que ele tem que voltar para casa, para sua maravilhosa “Georgina”. E ele volta.

Por que jogar, então? Não sei. Pergunte aos pescadores. Mas sem dúvida, o prazer está na caça, não no “abate”. O importante é manter a “chama” acesa. Para sempre.

[Lembrem-se: estamos falando de Literatura do século XX. Polêmicas EDUCADAS nos comentários serão bem-vindas] 

MILAN KUNDERA: NINGUÉM VAI RIR

Este conto retrata um professor de história da Arte chamado Klima com uma má reputação na Tchecoslováquia comunista. Este homem teve muitas mulheres frequentando seu apartamento ao longo dos anos e agora mora com Klara, sua namorada de 20 anos. Não contente em queimar sua imagem desse jeito, ele ainda emprestou sua moradia para amigos que deram festas barulhentas. Em suma, sua fama não é das melhores nas redondezas. E o comitê de construções de moradia sabe tudo sobre ele.

[SPOILERS – pule para CONCLUINDO]

Mesmo assim, o professor Klima vai levando sua vida excêntrica sem maiores problemas até conhecer um cientista desempregado chamado Zaturetsky. Esse novo personagem pede ao protagonista que revise um artigo sobre um artista obscuro sobre o qual passou três anos pesquisando e escrevendo. Klima, no entanto, apesar de concordar, não está nem aí para o trabalho do homem e começa a evitá-lo, a ponto de ter que mentir e mudar o horário de suas aulas para não ser perseguido por esse tal Zaturetsky.

Esse “stalker” acaba descobrindo o endereço do professor. Mas ele não está lá, só sua namorada, Klara. O que dá origem a uma ideia desastrosa: afirmar que Zaturetsky havia tentado seduzir a jovem, uma ação totalmente indigna. O homem acusado exige uma retratação, que não é feita. E a partir daí uma série de eventos vão enrolando Klima em sua própria teia de mentiras.

E por que mentir tanto e se esquivar tanto de um simples parecer?

Porque o homem lhe parecia um idiota, isso fica bem claro. Por que não dar o parecer logo pra ele parar de encher a paciência? Escrever qualquer coisa? Bem, o principal motivo é ESTE [SPOILER]:

“Você pensa que uma mentira vale tanto quanto outra, mas está errada. Posso inventar qualquer coisa, zombar dos outros, criar toda espécie de mistificações, fazer todo tipo de piadas e não ter a impressão de ser um mentiroso; essas mentiras, se quiser chamá-las mentiras, sou eu, tal como sou; com essas mentiras, não simulo nada, na realidade, com essas mentiras estou dizendo a verdade. Mas existem coisas sobre as quais não posso mentir. Existem coisas que conheço a fundo, das quais compreendi o sentido, e que amo. Não brinco com essas coisas, mentir sobre isso seria me diminuir, não posso fazê-lo, não exija isso de mim, eu não o farei.”

CONCLUINDO

Estes são apenas meus dois contos favoritos de “Risíveis Amores”, mas vale a pena saborear todos. Neles você vai encontrar ironia, humor sutil, erotismo leve, reflexões sobre a vida e, acima de tudo, excelentes histórias. Recomendadíssimo com 5 estrelas.

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